Quando o paulista Silvio Tavares, 47, embarcou para o Irã no começo de junho, seu objetivo era aperfeiçoar o farsi (idioma falado no país persa) e conhecer um pouco mais da cultura iraniana, mas a guerra entre Tel Aviv e Teerã mudou completamente seus planos do dia para a noite.
“Cheguei a Teerã no dia 2 de junho, e a minha intenção era ficar lá por uns seis meses. Quando os bombardeios começaram, tudo mudou. Do alojamento onde a gente estava era possível observar tanto os ataques de Israel como o sistema de defesa antiaérea do Irã”, relata o músico.
Ele chegou a estudar o idioma local por alguns dias na capital do país, antes do primeiro ataque de Israel. “Depois que a guerra começou, a dinâmica da cidade toda mudou. As aulas começaram a ser online, mas como a internet falhava muito, em seguida o curso foi interrompido.”
Nos primeiros dias, Tavares ficou hospedado em um alojamento universitário, mas depois acabou indo para a embaixada brasileira em Teerã, onde ficou alojado por uma semana antes de sair do país.
“Fui para lá para me sentir mais seguro. Um dia teve uma explosão a uns 500 metros de onde eu estava, aí sim fiquei preocupado e decidi me refugiar na embaixada. Mesmo porque naquela região também há outras embaixadas”, afirma.
Durante o conflito que durou 12 dias, Tavares notou mudanças na capital iraniana. “Nesses dias, a internet era bem ruim, funcionava muito pouco e, para fazer ligações telefônicas, também era na sorte. Os supermercados e as lojas de bairro continuaram abertos, e a gente até conseguia comprar comida. A diferença que observei é que os preços aumentaram um pouco, vi muitas filas nos postos de gasolina e percebi nitidamente como a cidade começou a esvaziar.”
Depois de esperar por vários dias por um plano da embaixada de retirada dos brasileiros, Tavares acabou pegando carona com outro brasileiro, Antônio Guerra Peixe, treinador da seleção brasileira de handebol de praia, que também estava hospedado no local. De lá, foram juntos para a Armênia.
“A embaixada brasileira não tinha um plano de ação claro para nos evacuar. Os funcionários fizeram o máximo para nos ajudar, mas o Itamaraty não estava dando autorização para que eles pudessem agir efetivamente. Então, a federação de handebol de praia do Irã, que levou o Antônio para o país, ajudou a organizar a nossa saída do Irã. Foi meio que uma ação conjunta“, diz.
Tavares contou que a embaixada brasileira monitorou a viagem deles o tempo todo e que tinha o contato dos motoristas. Os diplomatas também fizeram a ponte para que os dois brasileiros fossem recebidos em Ierevan, capital da Armênia, na embaixada brasileira.
Os dois saíram de Teerã na manhã do último domingo (22) e chegaram a Ierevan 22 horas depois. Durante o trajeto de 1.140 quilômetros, eles tiveram que trocar de carro três vezes. “Apesar de a gente ter sido parado duas vezes em controles e também na fronteira, o mais incrível é que foi uma viagem tranquila. Os policiais checavam nosso passaporte, pediam para abrir o porta-malas, mas logo nos deixavam passar. Além disso, os motoristas que nos levaram foram superbacanas e prestativos”.
Nesta quarta (25), Tavares saiu de Ierevan e desembarcou em Barcelona, onde ficará por algumas semanas.
Mesmo diante das mudanças forçadas pelo conflito, Tavares disse que não desistiu do curso. “Estou completamente apaixonado pelo Irã e fiquei realmente muito chateado e triste com essa reviravolta. Quando a situação se acalmar, pretendo sim voltar e concluir a missão de melhorar meu farsi e conhecer mais a cultura deles. Porém, isso ainda vai demorar um pouco porque vou ter que pedir visto e juntar dinheiro de novo.”
Iraniana no Brasil se preocupa com pais em Teerã
A ilustradora iraniana Fereshteh Najafi, 50, mora em Curitiba há nove anos. Ela está geograficamente longe do conflito, mas busca acompanhar a situação de seus pais e irmãos que moram em Teerã. “Mantemos contato pelo WhatsApp, mas, infelizmente, o governo, que é a causa de todos os nossos problemas, cortou a internet, e o acesso à rede está intermitente”, diz.
Fereshteh relembra situação semelhante quando era criança, durante a guerra Irã-Iraque (1980-1988). “A situação atual é muito estressante e triste. Ninguém sabe o que vai acontecer. Eu mesma vivi dias assim quando era pequena. Dias cheios de medo, ansiedade, preocupações e problemas que duraram oito anos”, afirma.