Em 2024, mais de 24 milhões de brasileiros deixaram a condição de insegurança alimentar grave, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). São pessoas que, até então, conviviam com a ausência de uma refeição diária mínima.
Mas sair da fome extrema não significa, necessariamente, alcançar a segurança alimentar. O conceito vai além da simples saciedade: envolve o acesso contínuo a alimentos em quantidade suficiente, com qualidade nutricional, diversidade e respeito à saúde. Isso inclui a preferência por produtos frescos e livres de agrotóxicos, conservantes e aditivos químicos, algo ainda distante da realidade da maioria da população brasileira.
Alimento saudável e o consumo de orgânicos
Alimento saudável não é apenas o que sacia a fome, mas o que garante nutrição segura e de qualidade. Nesse sentido, os alimentos orgânicos, livres de agrotóxicos, conservantes e corantes artificiais, ganham destaque. Embora tenham menor durabilidade e aparência menos atrativa em comparação aos industrializados, os orgânicos são reconhecidos por oferecerem benefícios à saúde e menor impacto ambiental.
No Brasil, esses produtos são identificados por selos oficiais de certificação e costumam estar localizados em áreas específicas dos supermercados, o que facilita a identificação pelo consumidor. No entanto, o acesso ainda é desigual.

Segundo a pesquisa “Panorama de Consumo de Orgânicos no Brasil 2023”, realizada pela Brain Inteligência Estratégica, 45% dos brasileiros entrevistados afirmaram consumir alimentos orgânicos regularmente. No Nordeste, esse hábito tem ganhado força, embora barreiras como o preço elevado e a distribuição limitada ainda dificultem o acesso amplo e diário. A maioria da população não consegue incluir esses alimentos em todas as refeições, seja por desconhecimento, seja por limitação financeira.
A rotina e o apelo dos industrializados
Com jornadas exaustivas e pouco tempo para cozinhar, grande parte dos trabalhadores brasileiros acaba recorrendo a alimentos industrializados. Trata-se de uma estratégia de sobrevivência diante de uma rotina marcada pela pressa, baixos salários e pela dificuldade de acesso a alimentos frescos e saudáveis.
Esses produtos, prontos para o consumo, com preço acessível e longa validade, tornam-se a principal alternativa para milhões de famílias. Mas essa praticidade tem um custo alto à saúde.

A nutricionista comportamental Victoria Lima destaca:
“Em uma sociedade pautada pela produtividade e marcada pela desigualdade social, torna-se mais acessível e rápido comer um biscoito recheado do que preparar uma refeição caseira.”
Apesar do crescimento da conscientização sobre alimentação saudável, montar um cardápio orgânico ainda é um privilégio restrito a uma minoria. A desigualdade social e os altos preços mantêm esse tipo de alimentação fora da realidade da maioria da população brasileira.
Custo e desafios da produção orgânica
A produção de alimentos orgânicos enfrenta obstáculos que impactam diretamente o consumidor. Sem o uso de conservantes químicos, esses produtos têm menor durabilidade e são mais suscetíveis a pragas, o que dificulta sua produção em larga escala.
Com menor oferta e custo de produção mais alto, os preços nas prateleiras disparam e, como consequência, muitas famílias de baixa renda acabam recorrendo aos alimentos ultraprocessados. É o caminho mais acessível, ainda que represente riscos à saúde e à qualidade de vida no longo prazo.
Os riscos invisíveis dos alimentos ultraprocessados
Com fórmula baseada em aditivos químicos, corantes, conservantes e realçadores de sabor, esses produtos têm sido associados ao aumento de doenças crônicas, como hipertensão, câncer e distúrbios hormonais.
Outro fator preocupante é o alto teor de sódio presente em produtos como embutidos, macarrão instantâneo, temperos industrializados e snacks. O consumo frequente favorece quadros de pressão alta e eleva o risco de complicações cardiovasculares.
Além disso, mesmo alimentos industrializados à base de ingredientes in natura podem conter resíduos de agrotóxicos. A exposição contínua a essas substâncias está associada a problemas neurológicos e infertilidade.
É nesse ponto que o debate sobre alimentação se amplia: não basta alimentar, é preciso cuidar.
Reportagem: Ruan Rodrigues

